quarta-feira, 16 de maio de 2012

Tributo à enchente

Os caminhos vão seguindo com a chuva a lavar
A sujeira urbana forma a correnteza
composta por lama, suor, restos pútridos,
insatisfação, injustiça, incompreensão...
Alguns na bonança em suas camas
enquanto outros ficam em companhia da desilusão
As marombas vão subindo e as costas encurvando
O lixo invade as casas junto com as reclamações

Praguejam o tormento que buscaram para si
Tudo o que vai, retorna três vezes
E o sofá que estava no igarapé
Agora quer novamente o abrigo da sala
E assim a rataria toma conta da pobre morada
O medo e o fedor do chorume também
A podridão do esgoto é a companhia eterna
Porém agora está mais perto, de maneira mais fraterna.

- Curumim, sai daí!
- Cunhantã, venha cá!
São os pais a gritar e a proteger a enorme cria
O reino da fome e da ignorância continua absoluto
Numa infinita involução
Nossos nobres governantes continuam fazendo pouco
Da iletrada e pisada população
"Para Miami? Vou mesmo! Quem manda esse povo não saber votar!
Então, a plebe burra que morra!!!"

Escolha de caminhos

O trovão anuncia a terrível presença no céu aparentemente límpido. Um som sinistro contrasta com a beleza celestial, constituída pelo intenso azul e o canto dos pássaros em nada combina com a chegada de nuvens pesadas e cinzentas.
A tarde segue com o ritmo desinteressante de sempre e a ira continua a querer explodir o tristonho coração de um ser desiludido em relação a amores e projetos de vida. Pelo menos amargos dissabores impulsionam para estradas desertas, ainda não exploradas. Sempre espera-se que no final da trajetória esteja uma lagoa com águas puras e que uma fênix recém-surgida das cinzas sobrevoe a cabeça de todos, num lugar bem alto, mostrando quem pode chegar mais além e atingir distâncias maiores.

Caso do acaso

O acaso será que existe?
Ou é um meio de acreditarmos
na existência do destino?

É o que move a vida?
Ou simplesmente serve
para mudarmos o caminhar?

Encontrar novas direções
soluções
desapegos
esperanças
curas
batalhas
chegadas
saídas
ilusões
sonhos
realidades abstratas
realidades concretas

tijolo
alicerce
muro
casa
prédio
construção
destruição
recomeço

ciclo
finito
infinito
partida
chegada
nova viagem
novo destino
novo destino
nova viagem

Fragmentos de diversas tardes

A agonia da espera tortura os ansiosos, 
abala um pouco aos calmos
e no final atormenta a todos.

***

Em pé, contemplo da janela um espetáculo,
composto por atores que representam papéis reais.
Muitos extremamente apressados, cheios de metas a cumprir.
Outros com uma vida simples, que não passa de dias a seguir.

***

A grama verdeja com a água e o sol,
mas os solados impiedosos transformam o verde
num imenso amontoado de secura e barro.

***

Um prato está vazio aqui na mesa
e um outro está completamente cheio,
na mesa aqui do lado.

***

Eis que num simples devaneio
surgem mirabolantes soluções.
Quem sabe pego um avião
rumo à eternas excursões.

***

Espeto no coração
Suspiros da alma
Corpo padece
A mente implora
Destino ignora

***

A cada dia tento derrubar um pequeno tijolo,
Cuja extração transforma o suor em sangue,
O pensamento no martírio mais insuportável
E a saudade de coisas que eu não vivi,
Em distâncias cada vez mais longas...

***

No alto de uma montanha calma e extremamente tranquila, uma jovem contempla a paisagem, enquanto o sono cede lugar à tristeza intensa e ao descaso completo. As lágrimas secaram e os gritos de dor ficaram contidos. Fecha os olhos. A escuridão toma conta. Abre os olhos. Acorda num minúsculo compartimento. O lugar era outro, mas tudo continua a mesma coisa...