quarta-feira, 23 de junho de 2010

O tempo pára VI

Em algum ponto da cidade, do estado, do país, do planeta ou até do universo, a alvura deu lugar a uma coloração furta-cores intensa, agredindo mais a visão do que o branco absoluto. A partir deste instante, Luana começou a ter uma dor de cabeça intensa, fazendo com que ela tivesse certeza de que estava esperando uma vaga para o inferno. "Mas será que eu pequei tanto assim? Meu Deus, eu não fui nenhuma santa e tem muita gente pior do que eu na Terra! Mereço mesmo ser castigada assim?"

A fase mais sapeca de Luana foi a adolescência. Ela era uma menina comum, que suspirava por ídolos, ouvia as mesmas músicas quase o dia inteiro num walkman vermelho todo amarrado e remendado que tinha "herdado" de um primo mais velho, que acabara de comprar o que havia de mais moderno na época: o disc-man. A jovem, junto com as amigas, olhava para os garotos da escola e da vizinhança. O grupinho formado por ela, Jéssica, Geyse, Aline e Tattyanny (sim, com essa grafia típica do subúrbio) gostava de analisar quem era o mais bonito, o mais gentil, o mais simpático...passavam muito tempo julgando e dando veredictos, que muitas vezes as lições da escola eram esquecidas ou feitas as pressas. Os pecados de Luana estavam ligados justamente aos meninos, pois sempre que tinha algum encontro inventava uma desculpa para o pessoal de casa, porque não queria ser incomodada.

A fase dos beijos foi bastante prolongada, até que a coisa começou a avançar com Júnior. Ela queria apresentá-lo como namorado para a família e ter o típico namorinho de portão, mas ele sempre desconversava. Chegou a temporada em que a jovem teve os dois maiores impactos da vida: viu Júnior aos beijos com uma garota da outra rua e notou que a menstruação estava atrasada. Dias depois conseguiu juntar uma pequena quantia para comprar um teste de gravidez, que deu positivo. Era Juquinha a caminho.

Luana estava apenas com 16 anos. Júnior nunca quis saber dela depois disso e a família dele mudou-se de cidade, desaparecendo da visão e da vida dela para sempre. Os avós de Juquinha nunca foram recebidos na maior casa do bairro e até hoje são os únicos que o menino conhece.

O estudos de Luana ficaram atrasados. Ela nunca conseguiu entrar na faculdade e quando começou a trabalhar, sempre foi explorada e ganhava pouco. Agora lá estava na clausura furta-cores, sentindo saudades até do supervisor carrasco que todo dia fazia gracejos grotescos e pegava no pé dela, porque nunca quis saber dele. A dor de cabeça passou, mas desta vez a escuridão começou a tomar conta do ambiente, como se estivesse numa sala de cinema. De repente, formou-se um retângulo luminoso, onde via um filme em que era a protagonista. Aquele era o filme da vida de Luana.

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